terça-feira, 20 de maio de 2014

Além dos bloqueios das estradas - Sociedade
Tyzhden (Semana), 17.05.2014
Roman Malko

Tyzhden conversou com os moradores das cidades abarcadas pela revolta separatista


Anna, de (Novohorodivka - Província Donetsk)

A vida das pessoas mudou muito. Muitos são os que querem sair daqui, muitos em desespero. Nossa cidade mineira é pequena, 15 mil habitantes, mas aqui vivem 36 nacionalidades. Quando construía-se Donbass, recrutavam a partir de todos os cantos da União Soviética. Moradores nativos são menos da metade. E por isso as pessoas, que são pela Ukraina, que compreendem, que lhes subtraem a Pátria, estão muito assustadas. Ontem à noite eu tive um quintal cheio de pessoas. Olham nos olhos e perguntam, o que fazer. Será que é o fim da Ukraina? A nenhuma Rússia não queremos, este é o nosso país, nós e nossos filhos nascemos aqui, nossos avós e bisavós aqui descansam. Eu, falando francamente, agora sento diante da internet e procuro na província de Dnipropetrovsk alguma casinha. Porque aqui, penso, nós não podemos ficar. Aqui sou conhecida como oposicionista e viver não me permitirão.

No desfile de 9 de maio um rapaz adiantou-se e gritou "Glória à Ukraina!", então ele foi vaiado, como se dissessem, cale-se, agora você levará um tiro na cabeça. As pessoas temem. Elas, em desespero choram e não sabem, aonde meter-se. Todos dizem: Kyiv nos abandonou, nós não lhe somos necessários, mas nós não queremos sair da Ukraina, esta é a nossa terra natal. E estes são muitos. Perguntam, por que Kyiv não ajuda. Pode-se contar nos dedos as pessoas que aqui perturbam tudo, trazem dinheiro, pagam aos alcoólatras e viciados, para que eles causem desordem. São dez pessoas. Será que é difícil levá-los? E então, na cidade tudo cessaria.

Há alguns dias os separatistas bloquearam a passagem de nível e não permitiram aos mineiros ir ao trabalho. Depois os obrigaram escrever, para aquele dia, pedidos de licença sem vencimento. Entregavam-lhes "coquetéis Molotov" e diziam, que se eles não os jogassem na Guarda Nacional, ela destruirá todos eles. Intimidam também com o "Setor Direito". Logo virão os "banderivtsi" (1) e matarão a todos. Precisa construir barricadas - venham e ajudem.

Nas estradas da cidade cerraram as árvores. O diretor da mina "Rússia" Oleh Shetsov, deputado provincial do Partido das Regiões, dispensou os mineiros do turno e mandou-os cerrar as árvores e proteger os postos de controle, nos quais à noite todos estavam bêbados, porque lhes pagaram com cachaça.

O prefeito dirige aqueles separatistas. Agora ele responde a duas questões criminais pelo recebimento de suborno e desvio de fundos públicos. Seu vice, está preso em Donetsk, também por causa de suborno. Agora eles não tem outra saída a não ser apoiar a república gangue. Bandidos aos bandidos. Só assim podem continuar livres. Dizem que quando vier a república, em alguns dias libertarão todos, e se vierem as autoridades de Kyiv, eles terão questões suficientes para prisão perpétua.

Quando teve lugar o "referendo" a favor desta república, não sei como ela se chama, e nem quero saber, o presidente deu instrução ao diretor do Prédio da Criação, onde acontecia esta farsa, arrumar a seção eleitoral. Eles planejaram trabalhar até às 22 horas, mas às 18 horas fecharam tudo e levaram os sacos ao escritório do Partido das Regiões, do outro lado da rua. Depois o prefeito saiu nas barricadas e disse: "Na nossa cidade há 12 mil eleitores, destes 10 mil deram seus votos pela república". Mas eu acho que é uma total mentira. Penso, não foram mais de 20% que votaram. Muitas pessoas não foram entendendo o que é isso. O prefeito e seu vice, a todos funcionários, e isto é mais de um mil pessoas, estabeleceu a condição: quem não participar do "referendo" perde o emprego. Então muitos foram, temendo a demissão. Mas também há influenciados pela televisão russa, e estes não são poucos.

Em nossa cidade há famílias numerosas, famílias que planejavam filhos para viver através de assistência financeira do Estado.

(Para 2014, desde 1 de janeiro, após mudanças: Para 1º filho: 10320 hryvnias (moeda local) depois do nascimento e mensalmente, por 24 meses, 860 hryvnias;
2º filho: 10320 hryvnias no nascimento e 1.075 durante 48 meses; 
Demais filhos: 10320 hryvnias no nascimento e 1.576,67 durante 72 meses.
A ajuda mensal comparando com salários é realmente substancial - OK)

E agora mostram, como em Slaviansk, as mãezinhas com as criancinhas vem à frente dos tanques pela república, assim são estas pessoas, são marginais. Infelizmente, temos muitas assim. Hoje elas recebem ajuda, para amanhã não sobrou nada, então elas simplesmente colaboram por dinheiro (recebem dinheiro pelas participações na propaganda - OK). Eu tenho dois filhos. Mas será que eu iria à frente de um tanque com criança? Eu tenho parentes na Ukraina ocidental, mas lá as pessoas são diferentes (Na Ukraina Ocidental a convivência com e sob os russos foi desde a II Guerra Mundial até a desagregação da União Soviética. Já na Ukraina Oriental o convívio começou em 1.654. Havia escravidão - OK)). Aqui todos são exasperados. Ainda compreendo os homens, mas as mulheres? Eles tem muito ódio nos olhos. Digo: vocês não entendem de política, por que assistem canais russos? Não acreditam o que aconteceu com o vizinho, mas acreditam o que diz a TV russa. Foram vocês que escolheram Yanukovych, mas agora vocês não aprovam Kyiv. É difícil. Fundamentalmente o povo é assim.

Em nossa cidade há 250 edifícios de vários andares. Destes, apenas 10 estão ligados ao aquecimento central. Eis uma vida miserável. As pessoas, para não congelar nos apartamentos, enchem garrafas de plástico com água quente, colocam na cama e aquecem-se. Certa vez na seção, quando votavam por Yanukovych, veio uma vovozinha de 80 anos, calçando botas arrebentadas, enroladas por trapos para ficar mais quente. Quando depositava o boletim, ele caiu. Deu para ver, ela votou em Yanukovych.

Tudo muito difícil, muito difícil. Se Kyiv não nos auxiliar, então, simplesmente, teremos que sair daqui.

Basílio, Druzhkivka (região de Donetsk)

Sentimento geral de tudo o que está acontecendo em minha cidade, e nos arredores - assustador. Tenho medo das pessoas que me cercam e cercam minha família. Embora seja muito difícil pelo fato que quase toda minha família apoia os separatistas, o "referendo" e todo este despropósito. No entanto, isto é apenas meia desgraça. Verdadeiramente assustador constantemente ver uma porção de pessoas armadas, ninguém sabe o que eles podem pensar e que uma bala perdida pode atingir alguém próximo. Constantemente você se sente vulnerável, e é muito desagradável.

Em Druzhkivka a ocupação dos separatistas foi facilitada pelos funcionários e milícia locais, então tudo nos parecia mais ou menos calmo, mas, ao lado, em Oleksievo-Druzhkivska houve muitos disparos, porque é a rota Donetsk-Kharkiv. E Slaviansk com Kramatorsk não estão longe. O exército ukrainiano la age mais ou menos - vem, destrói os postos de entrada e segue adiante e os obstáculos reaparecem, são construídos pelas mesmas pessoas.

Há muitos problemas de sobrevivência diária, por exemplo com alimentos. Eu tenho amigos no maior supermercado, e eles disseram que os gestores, literalmente de joelhos, pedem aos fornecedores até mesmo pelos produtos lácteos, para não faltar às crianças.

Mas eu sempre fui a favor da Ukraina, então continuo usar a fita na roupa e no carro. Conflitos violentos sobre esta questão ainda não houve - eu cresci nesta cidade, aqui todos me conhecem, eu conheço todos. Muitos dos meus amigos, infelizmente, apoiam os separatistas, mas nossa amizade está acima dos problemas políticos, amigo - é sempre amigo. No entanto, eu não me permitiria usar a fita em Kramatorsk ou Slaviansk, porque lá matam por isso. O pior de tudo, é que as pessoas temem expressar suas opiniões, porque não sabem o que esperar das pessoas armadas. Mas eu amo Ukraina, vivo com ela em meu coração, é o meu estado interior, portanto farei tudo para provar isto.

Myroslava (Mariupol)

Atualmente, a cidade está praticamente deserta. Os pais tem medo de deixar as crianças ir à escola, os estudantes estão ausentes das classes. As fábricas trabalham, mas os gráficos caem quando aumenta o confronto. A maioria das lojas no centro está fechada. Nos armazéns e supermercados as prateleiras estão meio vazias. Ao longo do perímetro central estão as barricadas de pneus, carros roubados e avariados, árvores arrancadas, balcões, sinais luminosos e painéis de propaganda. A entrada para o Conselho Municipal está cercada com três veículos blindados, queimados. Mais ou menos um terço do transporte público não funciona.

Após os acontecimentos de 9 de maio a população teme saques. Tiros que de tempo em tempo ecoam de diferentes regiões, incêndios dos prédios administrativos e lojas, roubos de veículos, queima de ônibus. Pelas ruas e pátios dos quarteirões de apartamentos andam de carro ou a pé bêbados separatistas armados. Eles gritam: "Rússia!", "Fascismo não passará!", etc.

Agora Mariupol recupera-se dos acontecimentos de 9 de maio. Os mais valentes andam e examinam as construções queimadas da milícia e do Conselho Municipal, fotografam-se na frente dos veículos blindados e das barricadas. A molecada e os borrachos tumultuam nos restos da unidade militar e da filial do PrivatBanco à procura de comida...

O trabalho dos jornalistas ukrainianos e estrangeiros  é perigoso, os separatistas procuram pegá-los, para não permitir fotos. Os trabalhos da mídia alemã encontraram um meio de abordagem - 200 hryvnias - e até tem deslocamento protegido.

Participar das ações de massa anteriormente já era perigoso. Desde março quase todas elas terminavam com ataques dos separatistas armados, e desde final de abril é completamente impossível. Os participantes de marchas pacíficas de Mariupol, com bandeiras oficiais, são marcados como "fascistas" e esforçam-se para liquidar facilmente. Foto de ativistas ukrainianos estão na parede do Conselho Municipal ocupado, com indicação de dados pessoais (endereço, número do passaporte). Constantemente telefonam intimidando e ameaçando.

Depois do início da desordem na cidade a comunidade pró-ukrainiana constantemente aumenta com novos ativistas e passou para ações de forma subterrânea. Foi criado destacamento de Mariupol, estabelecidos contatos com destacamentos militares ao redor da cidade, juntam-se recursos financeiros para o necessário indispensável - desde produtos a equipamentos especiais. Deve-se ressaltar que nenhum grupo do nosso destacamento não capitulou sob pressão dos "habitantes pacíficos". Os postos de controle na entrada da cidade controlam, exclusivamente, os militares ukrainianos.

Os habitantes patrióticos de Mariupol causam resistência aos atacantes, realizam detenções e levam os patifes à milícia, mas lá os soltam. Além disso os ativistas reúnem informações sobre ações dos separatistas armados e as transferem aos militares, informam a população através de folhetos. Acompanham os jornalistas internacionais e ukrainianos e também as missões de organizações internacionais.
Em suma, apesar das ineficiências e posição confusa do governo central, nós nos esforçamos não cair em desespero. Apoiamos-nos tanto com atividades de guerrilha, como com a compreensão, de que a força do bem sempre vence. Mesmo se não for imediatamente.

Só mais uma coisa. Nós, de modo algum conseguimos com nossos cérebros provinciais compreender: por que não introduzem a lei marcial, com tal destruição e assassinatos? Por que conduzir ao ponto crítico, se é possível resolver no nascimento. Os militares também estão chocados com esta situação, dizem, que para eles seria trabalho para duas horas.

1. A palavra "banderivtsi" vem do nome Bandera. Stepan Bandera era um dos organizadores do exército insurgente ukrainiano, antes da II Guerra Mundial, que visava libertar Ukraina do jugo russo. Esta organização ocorria na Ukraina Ocidental que ainda não era dominada pelos russos. Estes bravos ukrainianos acreditavam na ajuda dos alemães (e não é primeira vez que isto ocorre quando um povo subjugado espera que o inimigo do opressor será amigo do oprimido). Quando os alemães entraram em Lviv, no primeiro dia os insurgentes ukrainianos proclamaram o Estado ukrainiano. Imediatamente Bandera foi preso e enviado para um campo na Alemanha até quase o final da guerra. Continuou vivendo na Alemanha com liberdade restrita, pois sabia que poderia estar sendo procurado por agente russo. E foi o que aconteceu. Ele foi morto por um agente russo de nacionalidade ukrainiana. Nunca foi fascista, que é como xingam, e também com a palavra "banderivtsi" a todos os ukrainianos que se opõem a ocupação russa, aliás, a maioria que usa esta palavra nem sabe o que ela significa, e que se aplica muito mais a quem a usa. - OK)

Tradução: O. Kowaltschuk


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