segunda-feira, 9 de junho de 2014


Donbass: vingança do proletariado
Tyzhden (Semana), 08.06.2014
Trevor Foks

As armas russas transformaram os territórios, controlados pelos separatistas, num verdadeiro teatro de ações de combate. A população apoia os rebeldes, porque eles prometem restaurar a ordem e os valores da União Soviética. A região pode, rapidamente, tornar-se uma nova Transnístria.

Foi suficiente um mês, para tudo mudar no Donbass. Ainda no final de abril ocorria atividade de massa, Antimaidan, que imitava os mesmos métodos dos participantes dos protestos de Kyiv, mas desta vez - para expressar desconfiança ao novo governo do país.

Hoje, trava-se guerra na região. Não total, mas na área triangular, onde cada lado é de, aproximadamente 200 km e nos cantos as cidades: Sloviansk, Donetsk e Luhansk.

Neste triângulo vivem de dois a três milhões de pessoas. As estradas estão desertas. A vida parou. A maioria das pessoas não vai ao trabalho. Ficam em casa, porque tentam proteger suas casas e suas famílias. O comércio fica aberto por poucas horas. Conseguem comprar comida, têm água e também corrente elétrica. A vida continua apesar de tudo. Mas nas almas habita o medo.Cada um procura, pelo menos algumas novidades, e espera que sua casa não será atingida por um pedaço de projétil.

A um mês, a maior parte dos postos de controle nas estradas eram controlados por civis com bastões nas mãos. Agora há menos postos mas eles estão reforçados. Eles são administrados por jovens armados, em uniformes camuflados e balaclavas.

O exército ukrainiano mantém o controle do ar e detém algumas posições estratégicas, tais como o morro Karachun, onde está a torre da TV de Sloviansk, o aeroporto civil de Donetsk, um campo de pouso em Kramatorsk, uma série de pontos importantes nas estradas. No entanto, onde quer que ele esteja, por ele sempre espera o perigo. Constantemente ocorrem ataques. Na disposição dos rebeldes os modernos mísseis antiaéreos portáteis, são muito perigosos aos helicópteros.

A verdadeira guerra - é assunto de profissionais. Hoje a espinha dorsal dos separatistas formam homens que vieram do Cáucaso ou Rússia. Eles são auxiliados por voluntários locais. As ações ofensivas ocorrem sob a liderança do batalhão "Vostok", que apareceu do nada. Os combatentes podem ser identificados pela divisa militar cinzenta. A quem este batalhão é subordinado? Ninguém sabe.

Estes rapazes foram vistos em ação no dia 26 de maio no aeroporto de Donetsk. Eles partiram para ofensiva tentando cercar o aeroporto, com o uso de lançadores de granadas e armas individuais. Ficou evidente, que os homens não temem fogo, sob as balas movimentam-se sob arranco, são capazes de esconder-se em situações - problemas e usam seus autômatos com destreza, que trai o hábito.

O exército ukrainiano, que frequentemente esteve indeciso, tentando não ferir a população civil, durante este cerco, agia duro. A aviação bombardeou dois KAMAZ com reforço. Depois de alguns dias 34 caixões, revestidos com tecido vermelho, levaram para Rússia em uma enorme geladeira pintada com cruzes, com tinta vermelha.

Ironicamente, os nossos guardas fronteiriços deixaram o carro passar sem problemas, apesar de que ali estavam as provas da participação na guerra, dos "voluntários estrangeiros". Mas ninguém pensou que eles deveriam ser mantidos. Tal é a guerra.

A batalha pelo aeroporto parecia desafio dos separatistas ao recém eleito presidente Petro Poroshenko. Agora, a essência do conflito está se tornando cada vez mais clara. Preço da questão - tentativa de organizar uma nova Transnístria, que não oficialmente é apoiada pela Rússia, para enfraquecer ao máximo o Estado ukrainiano. Esta nova região poderia ser chamada de "Prydonbassya"  ou "Triângulo das Bermudas", pois trata-se de um fosso negro, onde agora qualquer um pode desaparecer facilmente, como já aconteceu com alguns grupos da OSCE.

Na região dominava ordem liderada por formações paramilitares. No entanto em cada cidade tentou estabelecer-se um governo alternativo que busca a liderança. A coordenação entre estas diferentes estruturas é fraca. Entre os líderes separatistas locais desencadeiam-se conflitos. Particularmente, entre Vyacheslav Ponomarov, o auto-proclamado prefeito de Soviansk e os que permanecem na Administração Estatal Regional de Donetsk.

Um dos conflitos vi com meus próprios olhos. Ponomarov diariamente às 17:00 horas dá uma conferência de imprensa na Câmara Municipal transformada em um forte, com sacos de areia colocados nas janelas. Chega num Mercedes azul blindado com a bandeira da "República Nacional de Donetsk", em vez da placa com números, acompanhado por homens armados. Todos os dias repete que vai ganhar a guerra. Dias atrás, quando lhe pediram comentar as decisões aprovadas por líderes separatistas em Donetsk, ele literalmente explodiu. "Na Administração se sentam os mentirosos! Eles não têm nenhum direito de falar em nosso nome..."

Essa é a atmosfera. Ao mesmo tempo não nos devemos alegrar-se com ilusões. Embora os líderes da rebelião não encontrem uma linguagem comum e coordenam mal as suas ações, eles utilizam a mesma terminologia e são representantes de uma identidade política: opõem-se contra "junta" de Kyiv, contra "golpe", contra "fascistas que apoiaram OTAN". Este movimento tem sua própria ideologia que consiste na tentativa de reviver uma nova versão da União Soviética.

Os separatistas se vêem como herdeiros dos soldados da "Grande Guerra Patriótica",  "devem criar resistência a América e Alemanha", "neo-nazistas" e "imperialistas". Mas isso não é tudo. Eles também querem restaurar a "justiça social" e introduzir o poder das "comunidades populares".

Nas primeiras semanas do conflito esta dimensão soviética não era muito evidente. Hoje, já está se tornando cada vez mais clara. Em Donetsk e Luhansk já apareceram "tribunais populares", que punem os rebeldes, e também a polícia secreta, a qual modestamente chamam "NKVD".

Os rebeldes sonham novamente nacionalizar a economia local e destruir os oligarcas. Daí a indecisão quanto a captura da residência de Rinat Akhmetov (O maior oligarca ukrainiano - OK) em Donetsk. Os locais destroçaram alguns supermercados e roubaram o estádio de hóquei.

Portanto, temos uma revanche do proletariado de Donbass. Segundo eles, nos últimos vinte anos houve "roubo do país". Essas pessoas , obviamente, não se beneficiaram com as mudanças. Então esperam "confiscar dos ricos aquilo, que os ricos roubaram dos pobres".

O discurso encontra ouvinte agradecido na pessoa da população local. Brutalidade e confusão? A culpa é de Kyiv. O exército ukrainiano aqui é visto como "potência estrangeira" que bombardeia pacíficos moradores. "Nós não somos terroristas, mas em nós atiram", - queixam-se eles. 

Helena vende peixe seco no mercado da aldeia Karlivka, que localiza-se 30 km  a leste de Donetsk. Ela diz: "Sim eu votei no referendum". (Houve um pseudo referendum por lá - OK). "Mas nas eleições presidenciais não fui. Kyiv faz todo o possível para dividir as pessoas, em vez de uni-las". E queixa-se: "Nós mal vegetamos. Com dificuldade conseguimos ganhar nossa subsistência, apenas um pedaço de pão".

Barricada, construída pelos separatistas, localiza-se cerca de 100 metros do mercado. Em 23 de maio aqui por quatro horas aconteceu uma batalha feroz entre os batalhões "Donbass" e "Oriente". O café-restaurante queimou inteirinho. Caindo na emboscada e não tendo benefícios quantitativos, "Donbass" perdeu 5 combatentes. Os ukrainianos não conseguiram recapturar Karlivka dos separatistas.

Nós saímos da via principal. A 3 km - aldeia Halytsynivka, antigo "Kolkhoz" (Fazenda Coletiva Soviética - OK). O mais novo prédio aqui - Palácio da Cultura em homenagem a Karl Marx. Impiedosamente passa por nós um trator barulhento. Perguntamos ao reforçado motorista, de peito nu, cabelo parecendo palha e uma cruz ortodoxa no pescoço: "Quem controla a aldeia? Kyiv ou Donetsk". "Só Deus sabe", - responde depois de um minuto de reflexão.

Daquele caminho batido a Ukraina parece uma realidade distante. Mas a "República Popular" dos separatistas também é abstração. Como muitas outras, esta aldeia - terra de ninguém que em 20 anos foi praticamente ignorada. Quem vai conquistá-la? Hoje, a resposta a esta pergunta não pode dar ninguém.
 
Tradução: O. Kowaltschuk

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