sexta-feira, 9 de outubro de 2015

Oksana Porzhiyevska: "Nos enviaram para Sibéria poque um KGB estava de olho em nosso aparamento..."
Vysokyi Zamok (Castelo Alto), 23.09.2015
Borys Kozlovsky

Coletivo da ópera "Natalka Poltavka"
Fragmentos de vida de ukrainianos durante e pós exílio

O autor desta publicação pode atestar que, nos anos do pós-guerra (1944-1947) em Lviv havia milhares de apartamentos desocupados. Por várias razões: Os judeus de Lviv (eles viviam nos melhores bairros) quase todos foram destruídos pelos nazistas no gueto. Em 1946-1947 - saída dos poloneses de Lviv para Polônia. Além disso, ficavam vagos os apartamentos de moradores de Lviv, represados pelo regime stalinista.

Os apartamentos livres serviram aos "segundos soviéticos" - milhares de oficiais russos, representantes de vários órgãos da polícia secreta repressiva, pessoas do partido e trabalhadores soviéticos. "Elite", procedente de vários lugares da União Soviética, não queria habitação em qualquer lugar, exigia moradia nas habitações de "luxo", austríacas e polonesas, principalmente no centro da cidade. Ocupavam os locais ainda quentes dos despejados moradores de Lviv...

Minha coetânea, médica-pneumologista, Oksana Borzhiyevska está convencida que a vida de sua família foi prejudicada pelo "problema habitacional". 

- Em 1945 meu pai comprou um bom apartamento na rua Dzerzhinsky (hoje - rua Vitoskogo). Preservou-se uma cópia da operação compra-venda: nela consta que o apartamento tem três quartos, cozinha, dois balcões. Listado imobiliário... Lembro, artisticamente decorados fogões, com azulejos brancos... Certa vez veio ao nosso apartamento um homem da KGB, ele gostou do apartamento e propôs ao nosso pai, escolher outro. Ele habitará o nosso. Com esta proposta ele perseguiu nosso pai. Finalmente disse: "Se não querem por bem, será por mal..."  Em 28 de maio de 1950, à noite, nos visitou a KGB com soldados. Anunciaram que pela manhã devemos estar prontos para deportação para região do Extremo Oriente da União Soviética. Os pais perguntaram o motivo. Se havia culpa deve haver uma decisão judicial. Responderam simplesmente que havia ordem... Uma vez havia uma piada amarga: o edifício mais alto em Lviv - KGB na rua Dzerzinsky. Porque dele se avista Sibéria... nós sentimos isto completamente...


- O que permitiram levar?
- O indispensável. "E isto pode?" E indicaram o retrato de Stalin na parede. "Isto pode!" Mas, sob o retrato do sátrapa estava escondido o retrato do Metropolita Andrey Sheptytsky, caro para nossa família. Antes da guerra mamãe estudava na escola das irmãs basilianas, gerenciada pelo Metropolita Andrey. Este retrato esteve conosco no exílio e voltou para Lviv...
Pela manhã me permitiram ir ao sapateiro buscar meu calçado que estava lá para conserto, para que não viajasse descalça.

- Por um mês ficamos em Bibrtsi, num porão, em seguida continuamos viagem num trem cargueiro até Sibéria Ocidental. Distrito Verhnoketskyy, cidade Rubinsk, na margem do rio Suyha. Deram um quarto num barraco. No início, meu pai trabalhou na extração de madeira, derrubava enormes cedros até ficar com úlcera perfurada. Com peritonite acentuada o levaram numa carroça, por 32 quilômetros(!) para o centro do distrito Bely Yar. Sentiu dores infernais. Papai esteve por um fio. À noite, sob a luz de uma lâmpada de querosene o salvou o cirurgião Kozlov, um ex-reprimido. Foi nesta ocasião, que eu decidi, em casa deve haver um médico. Mamãe não trabalhava, porque cuidava de mim e de meus dois irmãos menores, um inválido.

- Sobrevivemos com muita dificuldade. Muito nos ajudava a avó, viúva de sacerdote grego-católico. Ela viajava a aldeia Ivankov em Ternopil (Ukraina) à ex-paroquia do marido, e trazia produtos. Se não fossem os pacotes de alimentos que nos enviava, nós não teríamos sobrevivido. Ela negociou seu apartamento em Lviv, e nos enviou 2.5 mil rublos. Nós compramos uma casa velhinha e ficamos felizes por não viver mais no barraco.

Nós não sentimos hostilidades dos moradores locais. Lá havia uma grande comunidade ukrainiana, desde antes da guerra. A avó nos enviou as partituras da ópera "Natalka Poltavka", e papai preparou este espetáculo teatral. Todos os papéis desempenharam os reprimidos ukrainianos...

- A qualidade de ensino era muito boa. Tanto os professores quanto os pais eram exigentes. Eu era única que usava uniforme. Na gola e nos punhos mamãe bordava motivos ukrainianos. Também não tive problemas com o idioma russo. Em Lviv nossos vizinhos eram russos. Eu e minha vizinha Rogneda Yakubovich éramos amigas. Eu ensinei-lhe a língua ukrainiana, ela me ensinou o russo...

- Em 1953, após a morte de Stalin os filhos dos reprimidos foram liberados. Somente os filhos. Meus pais decidiram, que eu deveria voltar para junto de minha avó em Lviv. Não foi fácil para eles deixarem que eu , uma menina de 13 anos, enfrentasse uma viagem tão longa. Eu e Anya Tupes viajamos com muitas transferências - lancha, motonave, alguns trens. Nos trens ajudávamos aos guias, e eles nos tratavam bem, davam mais comida...

... Em Lviv voltei para querida escola 28. Parecia que fui bem recebida pelos alunos e professores. Mas, já no dia seguinte as crianças pararam de se comunicar comigo. Os pais disseram que minha amizade poderia prejudicar sua autobiografia... Eu fui na diretoria pegar meus documentos. O diretor prometeu consertar tudo, mas eu fui firme e disse que não queria estudar nesta escola. Vovozinha vivia na rua Kirov. Eu encontrei a mais próxima escola russa Nº 15 e para lá levei meus documentos.

Fui para escola russa porque na escola ukrainiana eu poderia estragar a autobiografia das crianças...
(A opressão manifestava-se em todas as ocasiões, o povo tinha medo - OK). O diretor da escola preocupou-se com o meu destino. Pegou a minha mão, levou-me para classe e pediu ao professor e às crianças, para que nos domingos, me levassem para sua casa, me alimentassem e se preocupassem com meu entretenimento. E assim aconteceu. Mas, mais se preocuparam comigo os pais de minha colega Tamara Saushkin. Depois das aulas nós íamos à sua casa. Eu tinha, lá, uma bata e chinelos. O pai nos alimentava com um jantar modesto, porque a família não tinha grandes recursos. Juntas fazíamos as lições. Depois me davam algumas moedas e me encaminhavam à parada do bonde. Quando Tamara ganhava uma roupa nova, a avó me dava dinheiro, eu comprava o material, e a costureira fazia um igual para mim... Na escola eu ia muito bem, especialmente em Física e Matemática. Na classe, quando ninguém conseguia resolver uma tarefa difícil, de matemática, eu a resolvia com duas opções. A professora Helena Petrivna perguntou: "Aonde você estudou? Na Sibéria, com Tatiana Borysivna Borysova. ""Sim eu a conheço - com ela estivemos na frente dos professores em Moscou. 

- Após a décima série, eu entrei no instituto de medicina. No exame de admissão respondia sem preparo, mas consegui resolver todos os problemas para Basil Baglai, também de uma família de represados. Ele prometeu, nos próximos anos, trazer-me o café da manhã. Cumpriu sua palavra... Os pais voltaram do exílio em 1957. Eu já estava no primeiro ano. Os pais pensavam que eu estava estudando no Instituto Politécnico. Quando me preparava para a primeira sessão, eles viram meus livros "Anatomia", "Fisiologia"..

- Eles, como "não confiáveis" não podiam conseguir um emprego segundo a sua especialidade. Minha mãe, professora por formação, acabou se instalando como funcionária num centro cirúrgico. O chefe do departamento disse que não precisava de pessoa inteligente, mas fisicamente forte. Mamãe passava todas as roupas do centro... O primeiro que deixou a vida foi papai, e após 26 dias também a mãe, que estava doente por longo tempo.
Minha profissão médica lhe permitiu prolongar sua vida por alguns anos... Minha mãe - é para mim um exemplo de força de vontade, e bondade humana. Cresceu órfã, perdeu tudo, passou pela Sibéria e tudo recomeçou do zero. Apesar dos golpes dolorosos do destino permaneceu uma espécie de Madre Teresa, pronta para aquecer com bondade, abraçar todas as pessoas.

Tradução: O. Kowaltschuk

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