quarta-feira, 26 de novembro de 2014

Sem 1933 não haveria 2014
Tyzhden ua. (Semana Ukrainiana), 22.11.2014
Irina Mahrytska

Penso, que os poucos intelectuais do nosso país e do Ocidente, que estão bem familiarizados com o tema do Holodomor e suas consequências para o atual e pós-genocida sociedade da Ukraina, dificilmente poderão ter dúvidas, que o extermínio stalinista de 1933 abriu caminho para a guerra hibrida de Putin no Donbass. Isto é, um ditador sanguinário repassou como herança a outro imperialista a destruição da Ukraina. 


O que acontece hoje, na região, todos sabem. Mas o que realmente aconteceu na Ukraina, no inverno e na primavera de 1933, compreendem, apenas alguns.

 Por que a morte pela fome é a mais temida.

Alguém dirá: "Porque ela é mais longa", - e isto é verdade, mas apenas parcialmente. Assim, se não houver comida, mas há água, a pessoa estará se extinguindo até por um mês, experimentando na última semana de sua vida terrível sofrimento físico. No entanto, a morte devido a fome considera-se mais feroz, principalmente porque transforma a pessoa em uma besta bípede, que é mais monstruosa que o mais cruel carniceiro, porque é capaz de comer não apenas sua própria espécie, mas também seus filhos.

Já por muitas vezes citei a passagem de Gregory Bevza, que sobreviveu a fome numa aldeia ukrainiana. "Simultaneamente com as mudanças fisiológicas do corpo da pessoa faminta muda sua psique. Forte e contínuo jejum amortece ou mata completamente os sentimentos humanos normais. Uma pessoa faminta não se posiciona perante o bem e o mal, a verdade e a mentira, justiça e injustiça, como uma pessoa alimentada. Os valores humanos naturais parecem de menor importância, insignificantes. Acima de tudo deseja-se comer. Morrem ou absolutamente não nascem os sentimentos patrióticos, de fé, amizade e amor".

Isto significa, que depois do Holodomor-genocídio, em julho de 1933, em aqueles que sobreviveram, os sentimentos já não se renovaram. Há evidências convincentes. Aqueles aldeões pós-genocídio não é que não colocaram nenhuma flor nas valas comuns, onde foram enterrados por causa da fome seus filhos, pais, maridos ou esposas - eles abriram trilhas, e às vezes até abriram estradas de terra, ao longo dos restos mortais. Sobre estes terríveis fatos eu soube de testemunhas vivas do Holodomor em várias aldeias de Luhansk - Slobozhanshchyna(¹), onde nas valas comuns até hoje não há sinais de sepultamento humano.

Os bolcheviques cuidaram, para que, ao estado animal em 1933 fossem conduzidos todos os aldeões e cossacos ukrainianos na URSS, Testemunhas do genocídio repetidamente mencionavam como, para as aldeias vinham automóveis com altos funcionários do Partido Soviético, que perguntavam a seus pais, a quanto tempo eles já não possuíam nada comestível, quantos aldeões morrem de fome por dia e que parte já morreu.

E os aldeões eram cerca de 75% da população da então URSS. Com iguais monstros morais eles criaram seus filhos e netos, que hoje já são citadinos e junto com seus descendentes constituem a maioria da população da Ukraina.

E isto, infelizmente, não é difamação do autor, do seu povo ou fantasias dolorosas. Eis uma citação do pesquisador da sociedade pós-genocida Nº1 na Ukraina, James Mace: "No extermínio em massa do povo ukrainiano, os traços ancestrais de sua ética, como hospitalidade, simpatia, cortesia, solicitude, ficaram no passado. Em seu lugar assenhorearam-se indiferença e crueldade".

O que já dizer sobre patriotismo e identidade nacional! Eles evaporaram-se na nação pós-genocídio como orvalho no sol...

Porque os russos continuam sendo irmãos para muitos ukrainianos.

Aquelas mesmas velhas testemunhas do Holodomor na região de Luhansk me garantiram, que até 1933 não ouviram de seus pais e avós sobre nenhum caso de casamento misto entre a juventude ukrainiana e russa das aldeias vizinhas, localizadas a apenas alguns quilômetros uma da outra.

Os russos para ukrainianos foram, então, representados de outra, não compreendida - inimiga civilização com totais aldeias pagãs, onde não evaporava o fedor da aguardente comum, e nos quintais cresciam ervas daninhas até a cintura.

Foi somente em 1933 que o mito imperial bolchevique, a fraternal amizade centenária das duas nações conseguiu encarnar-se à vida. Em parte porque, a mentalidade dos camponeses ukrainianos mudou sob a influência da ação do faminto terror vermelho quase ao contrário. E na região de Luhansk, como nas aldeias ao longo da fronteira com a Rússia em outras regiões da Ukraina, além disso ainda havia muito ponderáveis argumentos para manifestação do tal amor fraternal.

O fato é que, a própria divisão de fronteira em 1933 praticamente não existia, e os ukrainianos, agonizando devido a fome artificial, viam e sabiam bem, que nada parecido acontecia do outro lado. Sobre isto testemunharam os moradores, sem exceção, de todas as regiões fronteiriças de Luhansk.

E se era assim, então nos completamente desnacionalizados com o genocídio aldeões, a única garantia de não repetição do horror da esperada morte (porque as causas subjacentes do genocídio bolchevique eles não sabiam, e nem poderiam saber) restava maximizar a possível aproximação com os russos ou mesmo "disfarçar-se" neles.

É daí que vem a maioria dos sobrenomes ukrainianos distorcidos como Matviyenkov, Chepurnov, Zozulinyh, Shamraev, etc.

No russo-soviético (mas absolutamente não ukrainiano) espírito com estas pós-genocídio distorções foram educados seus filhos e netos, que já no nível genético odiavam quaisquer manifestações de patriotismo ukrainiano e "nacionalismo burguês" e as temiam como uma ameaça direta de repetição do inferno do Holodomor, que viveram seus pais.

É preciso observar, que tais descendentes dos desnacionalizados pós-genocídio camponeses ukrainianos de Slobozhanshchyna e das estepes cossacas, hoje constituem frágil maioria das cidades do Donbass. Por isso não há nada de estranho, que muitos deles durante o último censo, denominavam-se russos.

Por que exatamente Donbass e "Nova Rússia".

Mas é quase com a mesma negatividade percebe o nacionalismo ukrainiano a maioria não apenas de Donbass, mas toda "Nova Rússia", isto é, o Sudeste primitivo -predomínio se não da população russa, com população do idioma russo.

Primeiro, segundo dados de todos os censos gerais ukrainianos, tal fenômeno lá não há nem aproximadamente. Segundo, basta olhar para os nossos inúmeros russo-falantes patriotas do Sudeste, que hoje lutam no Donbass, e verificar mais uma vez: a questão não é o idioma.

Descaradamente mentem os ideólogos imperiais, que argumentam, que a atual e local mentalidade - prova que "Nova Rússia" - é uma genuína província russa, formada historicamente. Na verdade o descrito tipo de mentalidade formou-se pós-genocídio.

Para convencer-se, que anteriormente ao Holodomor a parte sul-oriental, mentalmente, em nada distinguia-se do restante, é suficiente lembrar o poderoso exército de camponeses de Nestor Makhno, combatentes do qual tinham consciência do camponês ukrainiano. Porque este exército formou-se, principalmente, em Katerynoslav, a cuja composição então incluía-se parte de Luhansk.

Surge a pergunta: o que de tão especial aconteceu durante o Holodomor, no nosso Sudeste, após o que ele hoje, no plano mental, é substancialmente diverso do resto do Estado? Afinal de contas, se você levantar os dados dos documentos de Kremlin dos anos 1932-1933, que referem-se à Ukraina, então neles, sobre quaisquer disposições especiais quanto a organização da fome artificial, nesta região, não há.

No entanto, o fenômeno de sua forte desnacionalização explica o conhecido intelectual ukrainiano Vadim Skurativskyi. Segundo suas observações, os moradores do Sudeste sofreram durante o Holodomor muito mais que o restante dos ukrainianos, precisamente porque viviam na zona de estepes. Quando os bolcheviques, no final de 1932, levaram todos os produtos comestíveis embora das aldeias, então os moradores que viviam nas zonas florestais ou zonas mistas de florestas e estepes, foram menos condenados, que os das estepes. Pois a fauna das estepes é muito mais pobre que a fauna da floresta.

Estes pensamentos de Vadim Skurativskyi são confirmados pelo famoso historiador americano Robert Conquest, que no seu livro científico - popular "Harvest of Sorrov" (Colheita  da Tristeza) publicou seus dados estatísticos relacionados à mortalidade dos aldeões ukrainianos em 1933, em geral, e em termos regionais. De acordo com eles, nas áreas do norte Holodomor causou a morte de cada quarto camponês ukainiano, na região central - cada terceiro, quando na região sudeste - aproximadamente cada segundo.

Deste modo, o genocídio bolchevique no sudeste da Ukraina foi o mais cruel, e, as torções mentais na consciência daqueles camponeses - mais profundas, mais difundidas e mais irreversíveis.

O mesmo Vadim Skurativskyi com tristeza constatou: "Conscientemente dirigido e perfeitamente executado o genocídio de 1932 - 19333 não permitiu a afirmação da Ukraina como um Estado forte e poderoso no continente europeu. Na verdade, para isto foi calculada a insidiosa ação pelos não étnicos-ukrainofobos. Naturalmente, que o conhecido publicista, pessoa com conhecimento enciclopédico, tinha em vista não a antiga URSS de 1930 (República Soviética Socialista da Ukraina) mas o nosso Estado atual.

O fato de que ele tinha razão, testemunha a ressalva da eternidade de James Mace: " Exatamente o estudo das razões políticas do Holodomor pode e deve desempenhar um papel importante no reconhecimento da historiadores, políticos e estadistas do Ocidente não apenas do passado da Ukraina, mas também do que está acontecendo aqui HOJE e o que pode acontecer AMANHÃ".

Especialmente desnacionalizado revelou-se Donbass, onde a concentração de russos e a mais alta na Ukraina, depois da Criméia. Toda esta situação necessitava uma política muito prudente e sábia, direcionada à restituição aos ukrainianos locais a perdida, em consequência do Holodomor, consciência nacional e aproximar ao máximo para a mentalidade européia a minoria de nacionalidade russa.

Em vez disso, sem exceção, nossos chefes de Estado apenas flertam com as elites políticas pró-Moscou, adotando o idioma russo durante suas raras e fugazes visitas a Luhansk e Donetsk.

Eles, com certeza, não leram agora a direcionada exatamente a eles cláusula do falecido James Mace, elaborada por ele nos primeiros anos deste século: "Pretensões a Ukraina têm raízes profundas na cultura política russa, e não podemos excluir, que cedo ou tarde Rússia decidirá apresentá-las não apenas nas palavras". Hoje ela já as apresentou. Por enquanto apenas na Criméia e no Donbass.

Rússia imperial, com total dimensão, aproveitou-se da política míope das elites políticas ukrainianas. Imediatamente após a chegada de Vladimir Putin ao poder no Kremlin começou um poderoso expurgo ideológico do Donbass. Aqui começaram fechar os, sem isto, poucos meios de comunicação ukrainianos, escolas, classes, cátedras.

Ao mesmo tempo Kremlin, não poupou dinheiro e poderosamente plantava aqui os valores do "Mundo russo", sua mídia, cultura, televisão. Porque ao contrário de Kyiv Moscou compreendia as consequências do Holodomor, e qual benefício dele poderia obter.

Os russos dominaram bem a conclusão de seu cientista político Sergei Kara-Murza: "Em tempos de crise social a destruição da memória histórica executa-se como um programa orientado". É daí que crescem as pernas da rejeição agressiva do Kremlin à verdade histórica do Holodomor na Ukraina!
Os resultados dessas diferentes abordagens de Kyiv e Moscou à nossa sociedade pós-genocídio no Donbass revelou-se terrível para Estado ukrainiano. Basta dizer, que conscientes de sua nacional independência, os ukrainianos, em Luhansk, nos últimos 10 anos, constituíam de-fato deplorável minoria - aproximadamente mil pessoas.

Foram exatamente eles que no inverno passado saíram com Maidan local, que em 9 de março foi dispersado pelas agências alugadas de serviços especiais russos-párias-titushky, que reuniram quase 2.000 de toda a região. Justamente no mesmo dia iniciou-se o movimento organizado pelos mesmos residentes, com a criação da infame "FSC".

E agora imaginemos a situação, se não houvesse Holodomor em 1933. Em Luhansk viveriam hoje 270 mil (eram exatamente tantos os descendentes do pós-genocídio na véspera da agressão hibrida da Rússia).

No aniversário de 200 anos de Taras Shevchenko (maior poeta ukrainiano - condenava a escravidão do povo ukrainiano. Ele próprio nasceu escravo russo - OK) então, em 9 de março sairiam, em manifestação, no mínimo algumas dezenas de milhares. Até o Holodomor "Kobzar" (Coletânea de poesias de Taras Shevchenko - é quase uma Bíblia para os ukrainianos conscientes - OK)  havia em casa de cada aldeão da Slobozhanshchyna, e até na Donshchyna(²)!

Não é necessário muita imaginação, o que aconteceria com aqueles 2.000 marginais pagos, que se atreveriam estragar o feriado nacional da grande massa , manipulados pela Rússia. O mesmo, provavelmente, esperaria as várias centenas de "titushky", que se esforçariam para invadir os prédios do SBU (Serviço de Segurança da Ukraina) e das administrações provinciais. E não haveria, então, a priori "DNR" e "FSC".

E Putin pensaria bem antes de chamar o Sudeste da Ukraina "terras russas".

Mas aconteceu o que aconteceu. E hoje, pessoas que esqueceram o passado, renunciaram às tradições nacionais, ao invés de defender Ukraina, lutam contra ela ao lado dos terroristas-separatistas. De acordo com minhas observações, cada terceiro deles tem raízes étnicas ukrainianas! Mas isso não é tudo. Exatamente os descendentes dos metamorfoseados constituem a maioria da população da Ukraina, e pelo trigo mourisco e dinheiro dos ladrões engravatados, durante os anos de independência da Ukraina elegem para liderança de nossa nação, segundo sua semelhança, profundamente amorais comerciantes, agentes da KGB - FSB, ex-comunistas, ex-Komsomol, descendentes daqueles mesmos "insidiosos - ukrainofobos", que criaram Holodomor, ladrões criminais.

Esta elite política durante os anos de nossa independência , destruiu e saqueou completamente o nosso poderoso exército ukrainiano, entregou seu um tiro a Criméia, e hoje sobre o sangue dos melhores filhos da Ukraina negocia com Kremlin o preço do território ukrainiano no Donbass.

E todas as próximas eleições em nosso país indicam: enquanto os pós-soviéticos descendentes das vítimas do Holodomor (aqueles que sobreviveram) continuarem maioria, ao SISTEMA de autoridade criminal nada ameaça.

1. Slobozhanshchyna - território histórico que abrangia atual Kharkiv, Sumy e parte de Donetsk e Luhansk na Ukraina. Voronezh, Kursk e Belgorod na Rússia. No final do século IX este território entrou na composição do territórios da Rus de Kyiv (Rus era o primeiro nome da Ukraina, do qual os moscovitas se apropriaram - OK). Os ataques tártaros, durante vários séculos transformaram este território em áreas desertas. A partir do século XV este território começou povoar-se com aldeões ukrainianos e cossacos dos lados direito e esquerdo do rio Dnieper. 

2. Donshchyna - terra histórica e geográfica da Ukraina, no lado direito do Baixo Don. Ocupa quase completamente as províncias de Donetsk e Luhansk, exceto as áreas localizadas ao norte de Seversky Donetsk pertencentes à Slobozhanshchyna .Em seu território de 50 mil quilômetros quadrados localiza-se região industrial - Donbass ou Bacia Carvoeira de Donetsk.

Tradução: Oksana Kowaltschuk

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