quinta-feira, 28 de setembro de 2017

Chantagem linguista húngara: se Budapeste enterrará o futuro europeu da Ukraina?
Ukrainska Pravda (Verdade ukrainiana), 26.09.2017
Sergey Sidorenko, Yuri Panchenko



No dia de seu aniversário, Petro Poroshenko recebeu um "presente" da Hungria.
"Ukraina pode esquecer a integração à Europa, "Hungria bloqueará quaisquer iniciativas benéficas para Ukraina, nas organizações internacionais, especialmente na UE" - estas não são exatamente as frases que gostaria ouvir não só o presidente, mas também o oficial Kyiv.

Como isto aconteceu.

Ukraina entrou em um forte confronto com vários países da União Européia. Não se trata apenas de húngaros - na semana passada, o presidente da Romênia cancelou uma visita  à Ukraina e não permitiu ao "speaker" do Parlamento da Ukraina visitar Bucareste, enfatizando que as relações amigáveis não devem ser discutidas até o problema educacional ser resolvido.

As ações da Hungria tornaram-se as mais quentes. As intenções do governo de bloquear todas as etapas de integração da Ukraina - um problema cujo valor não pode ser superestimado.

Ao mesmo tempo, tal afirmação não é motivo para polvilhar a cabeça com cinzas. É preciso entender como Kyiv deve agir, que erros cometemos e se possíveis concessões em nossas discussões com vizinhos.

"De alguma forma será."

O motivo da exacerbação sem precedentes, das relações entre Kyiv e Budapeste foi a adoção da lei "Sobre educação". A lei é enorme e complexa. A crítica dos vizinhos é ouvida apenas num de seus artigos: "Sobre a linguagem". Hungria, Romênia, Bulgária, Grécia e Polônia (Polônia, em menor medida) afirmam que a lei ukrainiana restringe os direitos das minorias nacionais; uniram-se a eles mais dois países, fora da UE: Moldávia e Rússia.

Vale a pena reconhecer: estes problemas não surgiram ontem, mas ainda nos dias do presidente Kuchma.

A situação que surgiu, não pode ser considerada normal. No Transcarpatia e Bukovina onde concluem a escola na língua romena e húngara, nem sempre conhecem o idioma ukrainiano, isto é, o idioma oficial. 

Mas, para o governo foi mais fácil não discutir com Hungria e deixar tudo como estava. "De alguma forma será". (O famoso ukrainiano: Якось воно буде - OK). Embora, de fato, o abismo aprofunda-se ano a ano.

O enclave linguístico que existia no Transcarpatia, repelia o futuro da juventude local e tornava impossível a integração de húngaros com a sociedade ukrainiana além dos limites de sua região. No entanto, esta situação era completamente adequada à Hungria. E nisto reside  a questão fundamental.

Esta situação complicava-se com o aproximamento das próximas eleições parlamentares dos nossos vizinhos.

Mitos e inverdades.

"Hungria, pertencendo à UE, bloqueará e vetará quaisquer medidas, que possam implicar novos progressos no processo de integração europeia da Ukraina no espírito do programa da Parceria Oriental".

Em outra declaração feita na terça-feira, o governo húngaro alega que Ukraina violou "muitas convenções internacionais" (não especificando quais).
A culpa da Ukraina para as autoridades húngaras é um axioma, não requer prova. Estes documentos testemunham que as autoridades húngaras guiam-se pelos mitos, ou com propagação deliberada de mentiras. 
Há uma semana o Parlamento húngaro aprovou a resolução, a  resposta à adoção da lei ukrainiana.

Uma situação incrível para o parlamentarismo europeu: o documento foi aprovado por unanimidade. Ninguém votou contra, ninguém se absteve.

Apenas as pretensões aos deputados ukrainianos, aprovados por seus colegas húngaros, revelaram-se distantes da realidade.

A decisão do Parlamento afirma que a lei sobre educação exige o "encerramento" de todas as escolas, universidades e instituições vocacionais no idioma de ensino húngaro. Embora, isso é claro, não é verdade, a lei não abrange o fechamento de instituições educacionais.

O Parlamento húngaro tem certeza, que o processo educativo no idioma das minorias torna-se impossível, embora a lei sobre educação refere-se à possibilidade de ensinar vários assuntos nas línguas da UE (inclusive húngaro e romeno).

De acordo com dados da Verdade Européia os húngaros informaram, que Ukraina queria ouvir seus desejos, mesmo com o fato de que nas escolas húngaras, a maioria ou metade dos assuntos será ensinada em húngaro.
Mas prontidão para diálogo não havia. Houve apenas para conflito. 

Alguém explica isto como período pré-eleitoral. Na primavera serão realizadas eleições parlamentares na Hungria. O primeiro ministro Viktor Orban estabeleceu o objetivo para manter a maioria constitucional. E esta é uma tarefa difícil.

Uma das estratégias do partido húngaro no poder "Fides" é a criação de inimigos. Então, a história ukrainiana acabou sendo muito relevante. Questões de estratégias (e não apenas no Transcarpathia!) os húngaros são muitos sensíveis, e o governo húngaro não quer nem falar sobre possíveis mudanças no "status quo". Mesmo que essas mudanças sejam melhores para os próprios húngaros. É por isso que todas as explicações, todas as propostas de Kyiv são simplesmente rejeitadas.

Seja como for, todos os interlocutores da "Verdade européia concordam: "Em Budapeste agora - uma completa histeria, além de limites de quaisquer fatos".

O que Ukraina deve fazer? Então, como deve agir Kyiv?

Primeiro, como nós devemos agir? De acordo com o autor - e esta opinião compartilham todos os diplomatas, com quem conversamos, - nós não devemos sacrificar nossos interesses em resposta à chantagem dos vizinhos. Perdoem pelos termos não diplomáticos, mas o que está acontecendo é difícil nomear de outra forma - trata-se de chantagem.

A "norma linguística" apareceu na lei sobre educação, não para brigar com os húngaros, sua presença tem outros motivos. É perfeitamente possível uma discussão interna na Ukraina, sobre conveniência de mudança desta lei, mas a decisão não deve ser aprovada em Budapeste, Atenas ou Moscou.
Ukraina já tem experiência, quando o estado vizinho procurou definir nossa ordem diária. Isto deve permanecer no passado.

Claro, os ukrainianos da Hungria são nossos cidadãos e a decisão final deve ser de seu interesse. Agora vamos retornar à possível resposta da Ukraina ao ultimato húngaro.

Em Kyiv já ouvem-se proposições para responder com a mesma moeda. "O que Hungria faz é chantagem, portanto, devemos agir da mesma forma", disse Volodymyr Ar'iev.
Ukraina realmente tem a possibilidade de uma resposta "áspera", muitas são as opções.
Também pode reunir fatos de ações não democráticas do governo húngaro e levá-los às instituições internacionais (como promete fazer o governo húngaro).
Afinal, pode-se recordar as próximas eleições húngaras, e o fato da Hungria contar com os votos dos compatriotas que vivem na Ukraina. Então, Ukraina poderia proibir a campanha de políticos estrangeiros na Ukraina - como a Alemanha proibiu a agitação na véspera do referendo turco.

Mas, essa estratégia seria razoável?

É necessário nutrir a hostilidade? Vale a pena excluir, que depois das eleições húngaras as paixões se acalmarão e surgirá oportunidade para um diálogo tranquilo? Em nossa opinião, as pontes queimadas com um vizinho, definitivamente não são a melhor estratégia.
Claro, isso não significa que nos próximos seis meses, anteriores às eleições, deve-se ficar com as mãos cruzadas. Os que sabem "ler entre linhas" já perceberam que Budapeste, apesar de toda a retórica bélica, deixa o caminho para reconciliação.

Na semana passada Kyiv e Budapeste concordaram na reunião da ministra ukrainiana, da educação, Lilia Grinevich, e de seu colega de recursos humanos Zoltan Baloha, ministro de recursos humanos da Hungria, na qual Ukraina poderá explicar como Kyiv garantirá os direitos dos húngaros locais no âmbito da lei educacional adotada. (Mas estava tudo explicadinho no artigo traduzido anteriormente. Será que a lei não estava? E, adotando o idioma húngaro até o vestibular, o aluno não sente dificuldades na hora do vestibular, no idioma ukrainiano, já que vive na Ukraina ? - OK)

E, na terça-feira, em uma declaração tempestuosa do ministro húngaro apareceu uma linhazinha dizendo que Budapeste está pronta para seguir esses acordos e aguarda negociações com Ukraina.
E este é, exatamente, o caminho que Ukraina deve escolher. Claro, não renunciar a nenhum passo dos nossos interesses nacionais.  E, percebendo que antes das eleições o governo húngaro não admitirá seus erros e não dará um passo para trás. Sim, o diálogo não será fácil. Mas destruir as pontes não está nos nossos interesses.

Erros de Kyiv.

Para não formar-se uma falsa impressão, enfatizamos: o lado ukrainiano nesta situação também cometeu erros estratégicos. O desenvolvimento do conflito mais uma vez demonstrou que, quando se trata de etapas estratégicas, de comunicação internacional e de ações conjuntas de várias autoridades, Kyiv  parece que perde a inteligência e aparecem erros após erros.

Era difícil não compreender, que a "norma linguística " da lei sobre educação se tornaria um trapo vermelho para os países vizinhos, mas para Kyiv isto foi possível.

A reação nervosa das capitais vizinhas, que apareceu imediatamente após a votação foi uma "surpresa" para todos os departamentos envolvidos, principalmente para o Ministério da Educação e Ciência.

Foram necessários sete dias (!!!) para realizar o encontro da ministra Grinevich  com os embaixadores dos poderes indignados. A ocupação exagerada  da ministra não é justificativa suficiente, ela tem substitutos ou chefes de departamentos. Apenas era suficiente compreender, a que problemas em grande escala dirige-se Ukraina, se estiver em silêncio. 

Detalhe interessante: na Bankova (na presidência - OK) Também não consideraram esta questão como prioridade. A crítica no Facebook  dos autores dessas linhas, causou genuína indignação na Administração Presidencial - algumas pessoas escreveram mensagens públicas e privadas, que aos húngaras enviaram explicações escritas, o que ainda lhes falta? Ou a visita de Lilia Grinevich a Budapeste - ela ocorrerá após um mês após a adoção da lei.

Ou a situação desta terça-feira. Lembramos, o conflito é antigo. Não era difícil prever, que a assinatura desta lei causaria nova indignação, Budapeste, por sinal, estava à espera da decisão de Poroshenko. Assim que a manhã chegou, os ministros húngaros fizeram uma declaração sincrônica.
Mas Kyiv, como sempre, não estava preparado - o Ministro das Relações Exteriores, o dia inteiro preferiu o silêncio (embora fosse suposto ter uma declaração preparada!) Somente no final da tarde apareceu a declaração da Bankova, e depois dela - tweet da ministra.

Embora haja um positivo. Ele é importante. Apesar da lentidão, a resposta de Kyiv foi correta e adequada à situação. O comentário das autoridades foi exatamente como devia ser. Ukraina continua pronta ao diálogo, não aceita ameaças, mas ao mesmo tempo não vai para exacerbação deliberada do conflito. 
Sim, nós reagimos devagar e nem sempre sabemos nos comunicar com o mundo. Mas, por sorte, neste caso, temos uma posição única das autoridades ukrainianas. Tendo o presidente, o Ministro dos Negócios Exteriores, o Ministro da Educação  e a maioria parlamentar  concordam, que a verdade com o conflito com a Hungria é do nosso lado. Há uma unidade no pensamento, que esta chantagem não deve funcionar. E isto é realmente importante.

No entanto, há sempre o risco, que depois de dois anos, próximo das eleições ukrainianas, entre as forças políticas ukrainianas surgirão os dispostos a usar "o caso húngaro" e novamente levantar a questão, para atrair os votos dos húngaros ukrainianos.

Papel da Europa

Após o ultimato húngaro, o conflito deixou de ser uma questão de relações bilaterais. Precisamos de uma decisão do árbitro e o seu papel será desempenhado pelo Conselho Europeu.
Aqui a nosso favor joga a reputação medíocre da própria Hungria, como um país frequentemente criticado pela violação de padrões democráticos (lembremos a brincadeira do presidente da Comissão européia Jean-Claude Juncker que cumprimentou Orban na cúpula com a frase "Saudações, ditador!"

Além disso, a questão do idioma é particularmente problemática. Os húngaros têm pretensões de todos os vizinhos -  à Romênia e Sérvia. Ultimamente, Budapeste oficial, em troca da extensão dos direitos da maioria húngara, convocou os húngaros locais a apoiar o partido no poder.
Mas todos esses argumentos não são suficientes para vencer em Estrasburgo - Kyiv deve provar a disponibilidade da Ukraina verdadeiramente proteger os direitos de nossos compatriotas de outras nacionalidades. Nós devemos explicar, que não há nenhum encerramento de escolas e os representantes húngaros, romenos e outras minorias terão horizontes mais amplos e oportunidades para uma carreira não apenas em húngaro ou romeno, mas também o idioma ukrainiano. (Para entrar na Universidade, na Ukraina, todos devem dominar o idioma ukrainiano - OK).

E aqui vale  a pena enfatizar um detalhe importante: quando, finalmente, obteremos as conclusões do Conselho da Europa, Kyiv deve cumprir suas recomendações e observações.

Conclusão para o futuro.

E, finalmente - sobre conclusões a longo prazo para Ukraina.
A démarche húngara - já é o segundo sininho para Ukraina,o que indica a necessidade de mudar as relações com os países da União Européia. O primeiro, lembramos, foi a decisão do Senado e Sejm da Polônia sobre a tragédia de Volyn.
O desejo de levar Kyiv a concessões usando o status de "advogado da Ukraina na União Européia" piorou significativamente as relações entre Kyiv e Varsóvia.
Uma crise ainda mais profunda nas relações com Budapeste mostra: a nova tendência da Europa Oriental é trocar seu apoio pelas nossas concessões.
E não espere uma mudança rápida dessa tendência.
Afinal, não há motivos para esperar mudança de governo nos próximos anos, quer na Hungria ou na Polônia. Além disso, não está excluído o aumento de problemas nas relações com a Eslováquia e a República Tcheca, onde cresce a popularidade dos eurocéticos.
Ukraina deve prestar atenção nessas tendências. Simplificando - pense em "mudar os advogados".

Atualmente, Lituânia e Suécia são os amigos mais consistentes da Ukraina. A Dinamarca nos ajuda cada vez mais, e a França, que anteriormente criou obstáculos na rota européia de Kyiv, aos poucos muda de posição.

Mas o futuro europeu da Ukraina depende, principalmente, da posição da Alemanha.

A diferença fundamental entre seu apoio (especialmente quando se trata da Suécia, Alemanha e outros países da Europa Ocidental) e o apoio usual dos vizinhos -  é que para esses países, as ambições europeias da Ukraina são confirmadas não pela nossa situação  geográfica e pela história comum, mas em primeiro lugar pela verdadeira reforma do país.

É por isso que Kyiv terá que trabalhar, provar a Berlim e outras capitais o realismo de nossas aspirações europeias. Entretanto, como mostra a démarche húngara caminhos fáceis nós não temos.

Tradução: O. Kowaltschuk

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