Radio Svoboda (Rádio Liberdade), 09.10.2016
Larissa Masenko
Foto ilustrativa |
A decomunização realizada na Ukraina, é uma das maiores conquistas da Revolução da Dignidade.
Remoção de esculturas de líderes comunistas e outros símbolos do passado soviético das praças, ruas cidades e aldeias da Ukraina foi um passo indispensável para construção de um país democrático e soberano.
Não menos significado tem a limpeza do espaço toponomástico, de cultivados títulos soviéticos, que o privam de identidade nacional e fazem-no parte padronizada do espaço geral unificado. Os títulos atuais, relacionados com a história e cultura ukrainiana isolaram a paisagem toponímica do país e lhe deram uma identidade nacional.
Permaneceu, no entanto, mais uma, bem pior tarefa - tarefa de de- russificação. Como observou em seu tempo a ativista russa dos direitos humanos Valeria Novodvorskaya, "a língua russa - é a cadeia, que liga Ukraina ao passado comunista".
Substituir a toponímia imperial com a nacional pode-se pelo caminho administrativo. No entanto eliminar, ou pelo menos enfraquecer a posição dominante da língua russa nos ambientes do país apenas com medidas administrativas é impossível. Mas, enquanto o idioma russo dominar na comunidade urbana na maior parte do território da Ukraina, uma grande parte da população permanecerá culturalmente e mentalmente dependente da Rússia.
A complexidade da tarefa de de-russificação não exclui a possibilidade de sua realização, como evidenciam as experiências bem sucedidas de países que conseguiram sustar os processos de decomposição linguístico-cultural de assimilação e criaram estados nacionais modernos. Mas, como mostra a experiência das Repúblicas Checa, Lituânia, Letônia, Estônia, Finlândia, Israel e outros países, a criação de sucesso nacional só é possível, quando a sociedade é capaz de trazer ao poder a elite com a linguagem e, portanto, com a consciência nacional completamente desenvolvidas.
Orientação Falsa
Profundamente falsa, com suas consequências, é a orientação atual da gestão, ao ukrainiano-russo bilinguismo, como um princípio da política linguística do estado. Um marcador claro disso é difundido em todo o território do pais um slogan bilíngue: Único país, Única Strana". (A palavra "strana" - país, só encontrei no dicionário russo, portanto é palavra russa, com a explicação: país; país dos Soviets - OK). Lembramos que o slogan fariseu "harmonioso bilinguismo russo - ukrainiano pertence ao arsenal de manipulações da liderança soviética. Sob este slogan dissimulava-se a política total de russificação que norteava-se com gravações no programa KPRC (Comitê Central do Partido Comunista da União Soviética), doutrina da futura "fusão das nações". Mas, na espera da vitória da idéia do comunismo em escala global Kremlin fazia todos os esforços para "fundir" as nações do império soviético em uma - russa. O idioma russo, deste modo, desempenhava o papel do principal meio integracionista da União soviética como "único país" com idioma unificado e desnacionalizada população, que Brezhnev em 1972 anunciou como "nova comunidade histórica - a nação soviética". (Eu penso que os intelectuais ukrainianos deveriam escrever mais sobre este tema nos jornais que o público comum lê. Uma, porque lutam pelo pão diário do dia a dia e o salário nem sempre é suficiente, e não dá possibilidade de dedicarem tempo nem dinheiro para edições especializadas, também porque não têm o hábito e nem cultura para edições elitizadas. Estas não são lidas pelo público em geral. Enfim, assumir mais a necessidade de esclarecer as pessoas comuns. Ir ao encontro do povo, esclarecê-lo. Então, também penso que nenhum presidente pronunciaria esta repulsiva expressão: "Único país. Única strana"-OK).
Embora o projeto comunista de criar uma única nação soviética, unificada com o idioma russo, fracassou, ainda que em parte, e, talvez, em grande parte ele foi realizado, especificamente quanto às nações "fraternas" (É o governo russo que usa esta expressão -OK) - Ukraina e Bielorrússia (Bielorrússia está completamente subordinada a Putin. Seu eterno presidente é apenas um garotinho obediente - OK).
Em relação a este respeito, a segunda parte do slogan "Único país. Única Strana" deve ser visto como uma relíquia da política linguística - cultural soviética que encontrou continuação na Ukraina atual.
Uma série de declarações e ações dos líderes do governo, mostra que eles estão muito preocupados com os direitos da população da língua russa do que com a língua ukrainiana. Isto é evidenciado pela recusa de abolir a lei "Sobre princípios da política da língua oficial" de Kivalov - Kolesnichenko, que realmente deu ao idioma russo o status de estatal, nomeando para altos cargos administrativos pessoas que não dominam o idioma ukrainiano. A discriminação do idioma ukrainiano em todos os canais da TV, cada vez maior difusão do idioma russo no espaço visual nos assentamentos, etc. (As TVs na Ukraina pegam transmissões diretamente da Rússia, não sei se em todos os locais. Ainda produzem no idioma russo na Ukraina. Algum tempo atrás editaram a lei de uso do idioma ukrainiano na TV. Não lembro a porcentagem mas era baixa. Será que até isto já caducou? - OK).
Tal apoio ao idioma russo nos altos escalões do governo, entre outras coisas, causou um fenômeno psicológico muito negativo. Isto legalizou o comportamento anti-ukrainiano, daqueles, que embora menos numerosos, grupos da população do idioma russo, julgam-se portadores da superioridade imperial da cultura russa, colocam-se negativamente ao idioma ukrainiano. Tais pessoas apresentaram atividade também no período do presidente Yanukovych considerando aquele governo expressão de interesses pró-russos. É extremamente lamentável que durante o governo atual, e ainda em termos da guerra russo-ukrainiana, tais grupos, especialmente nas cidades mais russificadas, ativam-se nas manifestações agressivas de não aceitação de tudo o que é ukrainiano.
E, como previam os especialistas sobre questões de linguagem, ainda no início dos anos deste século, que levantar o status da língua russa, levará à divisão da população e provocará inúmeros conflitos na questão do idioma, e foi exatamente o que aconteceu depois da aprovação da lei Kivalov - Kolesnichenko (Aprovada em 05.06.2012, em primeira discussão, em 03.07.2012 por 248 votos. A votação ocorreu com violação da Constituição da Ukraina, normas do regulamento e procedimentos para avaliação. Em 31 de julho, apesar da declaração categórica no ar, no canal "Rada" (Conselho) sobre não assinatura do documento, adotado de tal forma, assinou o presidente do Parlamento.
Exemplo de Ohmatdyt
Daremos apenas um exemplo, talvez pequeno, mas muito revelador para ilustrar o crescimento da tensão nas relações inter linguais.
No departamento cirúrgico do maior hospital infantil Ohmatdyt a artista, com um grupo de voluntários decorou as paredes com pinturas, mas a inscrição de nomes dos peixinhos escreveu com o idioma russo. Quando as inscrições viu a escritora infantil, dirigiu-se através do Facebook à autora dos desenhos com a exigência de substituir as inscrições russas pelas inscrições ukrainianas. Como a artista se recusou a fazê-lo, explicando que ela própria é nascida em Kyiv, que está acostumada ao idioma russo, inclusive com suas crianças, a escritora dirigiu-se ao Ministro interino da Saúde com o pedido de resolver o conflito por meios administrativos. Finalmente, a artista cobriu com tinta os nomes russos Pelaguea, Praskov'ia, Mafra e outros.
No entanto, o conflito, com isto não acabou, porque encontrou continuação na mídia. A defensora do idioma ukrainiano recebeu dos defensores russos muitos insultos e acusações de delação e abusos dos direitos da pessoa. Particularmente especial atividade revelou a professora de estudos culturais da Universidade Pedagógica de Michael Drahomanov, Eugênia Bilchenko, que falou como especialista sobre o esclarecimento deste conflito no "Rádio Público" e colocou em seu site uma petição em apoio ao direito da artista em assinar seus desenhos com o idioma que quiser. Apresentando-se como membro do Conselho Europeu de proteção dos direitos da pessoa Bilchenko defendia o bilinguismo da Ukraina, recorrendo aos exemplos da Bélgica e Suiça, como muito gostava Vadym Kolesnichenko e validade dos quais à política linguística da Ukraina há muito tempo negaram os profissionais.
A incompetência em estudos culturais no domínio das normas européias de linguagem dos direitos da pessoa mostra sua confusão na aplicação do idioma estatal e idioma das minorias nacionais. Sem dúvida a artista, figura do escândalo, tem todo o direito de usar na vida privada o idioma russo. Também ela tem direito de assinar suas pinturas com este idioma, mas apenas no caso quando ela as apresenta em sua exposição privada. Mas, pintando as paredes no espaço público de um hospital estatal onde se tratam crianças de toda Ukraina, a pintora é obrigada a cumprir o 10º artigo da Constituição da Ukraina.
Em geral, um tal conflito é difícil imaginar em quaisquer país europeu, aonde claramente são divorciadas as esferas do uso dos idiomas e no qual o estado fornece o maior apoio e promoção ao idioma que cumpre as funções estatais, ou como mais frequentemente o denominam, oficial.
E ainda é mais difícil conceber em quaisquer país civilizado, ofensas brutais na televisão ao vivo para o endereço da pessoa que defendia a obrigação constitucional de uso do idioma estatal na esfera pública. Para nós isso é possível, disse comentando o escândalo linguístico no hospital Ohmatdyt no canal da TV de Kharkiv, o diretor de "Auditoria Pública " Maxim Holdarb não escolhia palavras para sua indignação com o "indigno" comportamento da escritora Larissa Nitsoy (a ela que era oponente da artista do idioma russo) chamando-a de "hadostyu" (sujeira vilania, torpeza, obscenidade, etc.), espantalho que veio ao Ohmatdyt abalar os fundamentos.
Interessante seria saber, que "fundamentos", de qual estado, tão emocionalmente protegia Holdarb. Será que da Ukraina?.
Pintura da artista Vitória Tseluyko. Cada palavra em ukrainiano - tijolinho para o fundamento do Estado. |
A voz ukrainiana ganha forças. No romance "Pequeno drama" de Valerian Pidmohylnyi, que reflete o período de ukrainização dos anos 20 em Kyiv, mostra a imagem de uma chauvinista russa, que indigna-se com a presença na cidade, de pessoas jovens, que nos lugares públicos falam alto em ukrainiano. É ridículo ouvir, - declarou a "radical de Kyiv", - num poderoso elemento russo de nossa cidade, esta débil vozinha ukrainiana..."
A língua ukrainiana hoje, em seu 25º aniversário de Independência da Ukraina não ressoa em Kyiv como deveria o seu idioma em sua capital. No entanto, a voz ukrainiana gradualmente ganha forças. Já muitos cidadãos, especialmente os jovens, integram-se nas comunidades locais, para fundar cursos do idioma pátrio, clubes de comunicação dos falantes do ukrainiano, expressar seu direito em receber no idioma ukrainiano a produção da indústria cultural, organizar ações que estimulem outros em comunicações e passar para o dioma ukrainiano, etc.
E isto dá esperanças, de que nestes ambientes forma-se uma nova elite nacional para a qual os valores nacionais são mais elevados do que o desejo de usar o poder para único propósito de enriquecimento pessoal.
Larissa Masenko - Doutor em Filologia, professor da Universidade Nacional de "Kyiv-Mohyla Academy"
Nenhum comentário:
Postar um comentário